Poesia é sentimento, expressão de uma emoção.Carlos Drummond de Andrade.
“Tenho aversão à subjetividade. Em primeiro lugar, tenho a impressão de que nenhum homem é tão interessante para se dar em espetáculo aos outros permanentemente. Em segundo lugar, tenho a impressão de que a poesia é uma linguagem para a sensibilidade, sobretudo. Uma palavra concreta, portanto, tem mais força poética do que a abstrata. As palavras pedra ou faca ou maçã, palavras concretas, são bem mais fortes poeticamente do que tristeza, melancolia ou saudade. Então, a obrigação do poeta é expressar a subjetividade – mas não diretamente. O poeta não tem que dizer 'eu estou triste'. O que ele tem é de encontrar uma imagem que dê ideia de tristeza ou do estado de espírito – seja ele qual for – por meio de palavras concretas – e não simplesmente se confessando, na base do 'eu estou triste'. Minha definição de emoção não é nada de especial. É o que todos chamam de 'emoção'. O que acontece é que me recuso a explorar essa coisa diretamente. O interesse do poeta não é descrever suas emoções. É criar emoções, é criar um objeto – se é um poeta, um poema; se é pintor, um quadro – que provoque emoções no espectador. Mas não explorar nem descrever a própria emoção. Quando digo que sou contra a emoção é exatamente nesse sentido: o de usar a minha emoção para fazer, com ela, uma obra, descrevê-la primariamente e construir, com ela, um poema”.
João Cabral de Melo Neto.
Trecho da entrevista concedida ao repórter Geneton Moraes Neto no apartamento em que o poeta morava, na Praia do Flamengo, Rio de Janeiro. O depoimento foi publicado no livro "Dossiê Drummond", escrito por Geneton, em contraposição à visão de Carlos Drummond de Andrade sobre o fazer poético.
Procura da poesia
ResponderExcluirNão faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.
Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.
O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.
Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.
Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.
São os fracos...
ResponderExcluirNão diria que se contrapõem, mas que se complementam.